Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

24
Jan 20

Jazem na minha mão as palavras da saudade.

O mar alicerça-se no quadriculado caderno da madrugada,

Sílabas loucas,

Corações abandonados, numa esplanada de areia,

Esqueletos vadios,

Cansados de viver,

A luz traz as amoreiras em flor,

Mártir silêncio dos poemas adormecidos,

A paixão dos mortos,

Quando um barco se perde no Oceano,

O marinheiro afoga-se no poema,

Lê em voz alta, para todos ouvirem, os mandamentos das gaivotas,

E, sem regressar, procura o sexo na escuridão.

Salta da maré um pequeno veleiro adormecido,

De lágrimas nos olhos, grita pelas almas que partiram,

Ninguém o ouve; a luz.

Todas as manhãs, antes de acordar, o marinheiro chora pelos que partiram,

Ao longe, uma bandeira em demanda,

Sofre, grita,

Mas… não adianta.

Pelos vistos, os mortos não regressam nunca ao local de partida.

O corpo escurece,

Derrete nas pálidas madrugadas, quando do silêncio, uma criança brinca no convés do navio,

Todos os barcos, loucos,

Internados em Psiquiatria,

Enfermaria azul, cama vinte e cinco,

Drageias para todos os navios,

Não dormem,

Mas… sofrem.

Sofrem de quê?

Do silêncio,

Da solidão que provoca o silêncio.

O amor nasce entre os cortinados do camarote,

Na enfermaria, um dos barcos internado, grita pelo enfermeiro;

SOCORRO!

E, ninguém. Ninguém o ouve.

Apenas o comandante está autorizado nas visitas, poucos minutos, servem para acariciar-lhe as âncoras da tristeza,

QUERO SAIR DAQUI.

Todos o queremos.

Uns, mais, outros, menos.

Mas os barcos são teimosos, e, firmemente, alegremente, fogem…

E, só a paixão dos mortos consegue sobreviver ao destino.

Sofre. Grita.

Zurra nas amêndoas em flor, descendo socalcos,

Subindo rochedos,

E outros demais silêncios.

A loucura pertence aos pássaros,

E, aos barcos.

Torna-se na viagem mais inclinada do Universo,

Quando todos sabemos, que o mar, os pássaros e, os barcos,

Morrem.

Morrem nas clandestinas sanzalas do silêncio.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

24/01/2020

publicado por Francisco Luís Fontinha às 20:07

17
Dez 17

Conheci-te na plenitude da vida,

Eras uma árvore sem destino,

Cansada de habitar o meu jardim,

Parti e ficaste suspensa no cacimbo, e, até hoje, vives na clandestina noite,

Ausente,

Permanentemente sofrida com os corpos que abraçaste,

Longínqua tarde de despedida,

Nada a fazer, meu amor,

A saudade alicerça-se ao olhar dos flamingos,

Saltitando na tua sombra,

A morte, a sofrida morte entre parêntesis,

Numa pequena folha de papel…

 

Conheci-te era eu criança, menino sem destino,

Brincava nos teus braços,

Como se fosse uma andorinha na Primavera,

Alegre, agachava-me debaixo de ti, meu amor,

E, alegremente sonhava com os teus frutos,

As mangas, as folhas caiam derradeiramente sobre o meu cabelo,

E dos calções, as primeiras palavras escritas no teu tronco,

 

Amo-te!

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 17 de Dezembro de 2017

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:28

01
Ago 17

Uma janela com vista para o mar,

O barco da despedida espera-me, e brevemente estarei nos teus braços,

Um livro recheado de imagens a preto-e-branco,

Renasce na tua mão. Posso manuseá-lo, mas perco os desenhos imaginados pelo louco autor das searas imaginárias,

Enquanto o trigo se despede da planície…

 

Eu brinco com o teu olhar escondido na sombra das árvores.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 1 de Agosto de 2017

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:33

24
Fev 15

Desenho_A1_056.jpg

(desenho de Francisco Luís Fontinha)

 

 

quando as palavras semeadas no papel envelhecido

morrem

aquele que as escreve

despede-se

entre lágrimas e falsos sorrisos

um desenho insignificante

poisa docemente no vulcão da madrugada

sem mágoa

ou... ou paixão

abraça-se à noite dos tristes aconchegos

grita pelos sonhos

e... e em vão...

 

percebe que a vida é um triângulo de luz

voando nas ruas húmidas do desejo

tenho medo do silêncio

e do cansaço dos dias junto ao rio...

aquele que as escreve

despede-se

e parece um vadio

esmiuçando ossos e cigarros

ou... ou talvez não...

porque tem no corpo um vazio

um buraco negro recheado de insónias e imagens sem nome

como têm os pássaros nos prismas imaginados por uma árvore doente...

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 24 de Fevereiro de 2015

 

publicado por Francisco Luís Fontinha às 20:51

28
Out 14

Os relógios enferrujados

encolhidos nas tristes alvenarias

as janelas escondidas...

no olhar da serpente

 

as estilhas adormecidas

nos pregos dentados

os relógios... os relógios encalhados

em rochedos rendilhados

 

o pólen de um olhar

semeado na escuridão

e os relógios sem fôlego

e os relógios... e os relógios sem pão

 

e a paixão?

matriculada nas putas avenidas

correndo

saltando... os muros embriagados dos ossos embalsamados

 

os relógios...

escrevendo na pele da solidão

horários enlouquecidos...

sem vontade de sonhar

 

sonhar a paixão?

há cadáveres perdidos

na eira da infância...

colchas de linho... suspensas nas árvores tombadas no chão.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 28 de Outubro de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:45

14
Ago 14

Uma casinha habitada por pequeníssimas lâminas de papel,

um coração de cacimbo voando sobre as sanzalas com telhados de insónia,

um homem, um poeta..., e a amante do poeta,

um corpo pendurado na preia-mar,

que espera o regresso do sonâmbulo cansaço da madrugada,

o silêncio disfarçado de mendigo passeando-se pelas ruas da cidade,

uma janela que nunca, que nunca se abre,

um poema nas mãos da clarabóia com braços de luar,

uma casinha,

e lâminas de papel,

um sorriso, um desejo... e três círculos de luz nos lábios do pôr-do-sol,

o sonho...

 

As paisagens pigmentadas nas paredes da casinha,

as palavras acorrentadas no estendal poético,

uma eira deserta, uma eira de vinil girando na noite...

e o sonho,

e o lugar que me falta alcançar antes de morrer,

a escola morta, a escola um amontoado de escombros,

cadernos apodrecidos,

quadriculados momentos que ficaram sob a árvore de sisal,

um menino brincando com um velho “chapelhudo”...

e um triciclo com o assento em madeira,

o mar, o mar do Mussulo em tracejadas rotações de amar,

no sonho, no sonho de voar...

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quinta-feira, 14 de Agosto de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 19:29

17
Jul 14

Não me perguntes onde vivem as cidades com coração de pedra,

porque a noite é escura, porque a noite é bela, e sombreada...

não me perguntes de quantos desejos estou à espera,

porque não espero desejos,

porque não existem desejos nas cidades com coração de pedra,

 

Não me perguntes a cor do meu olhar,

não,

sim, sim... eu tenho olhar,

mas... mas não desconheço as cores,

mas... nunca vi o mar, o amor, e as flores,

 

Não me perguntes...

porque há em mim uma lâmina em betão armado,

triste,

triste e cansado,

não,

não me perguntes pelas árvores do meu quintal,

não, e nunca... e nunca tive um quintal,

e nunca, até ver... fui... fui degolado,

posso ser parvo,

e louco,

mas... mas não conheço as cores,

mas... mãos não sei o significado de “amores”,

 

Tudo para mim é pouco,

e perguntarem-me pela madrugada é como se me tirassem os livros, e o luar,

e a insónia, e todos os sonhos de criança...

 

Não me perguntes onde vivem as cidades com coração de pedra,

não me digas que amanhã os beijos são de papel,

não, não o suportaria...

que um dia,

que um dia me perguntasses como são os meus lábios enquanto dormem...!

 

Porque,

Porque os meus lábios nunca, nunca, porque os meus lábios nunca dormem.

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quinta-feira, 17 de Julho de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:41

04
Mai 14

esta casa sem mãos

esta casa com paredes de papel

esta casa sem janelas

porta de entrada

sem música

ou... palavras,

 

esta casa disfarçada de corpo

o teu corpo vestido de granito

esta casa

este grito,

 

esta casa sem amor

nem luz

nem... nem flores

esta casa vadia

escondida nas árvores do quintal imaginário

coitada desta casa apaixonada

que sofre

que vive...

esta casa

uma casa embrulhada em poesia

esta casa sem paixão...

esta casa... uma casa sem coração.

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 4 de Maio de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:48

18
Abr 14

quatro bancos em madeira

um jardim em desassossego

três árvores

… duas belas mulheres

uma Primavera

com plátanos de brincar

quatro bancos em madeira

dois corpos em translação

quatro seios em rotação

… e duas belas mulheres

duas mulheres em solidão

quatro bancos em madeira e uma gaivota em papel

 

um barco com pálpebras de chocolate

um marinheiro vestido de vampiro

duas belas mulheres

e quatro bancos em madeira

percebem na insónia a sinfonia dos candeeiros com braços de prata

um jardim em desassossego

um Oceano desgostoso

triste...

tão triste como os fios de nylon que aprisionam o sexo dos pássaros

uma Primavera inventada pelo poeta dos farrapos amanhecer

senta-se nos quatro bancos em madeira...

… acaricia as duas belas mulheres e as três árvores

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sexta-feira, 18 de Abril de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:07

29
Mar 14

foto de: A&M ART and Photos

 

Ele tinha um coração em pedra, daquela pedra ínfima que alimenta os beijos nocturnos dos pássaros,

vinha a chuva, e viam-se-lhe as perdidas chapas de zinco nos pobres telhados da madrugada,

hoje, ele, hoje ele dispensa o significado da palavra “AMOR”, porque onde a tinha escrito, na folha caduca da árvore tombada, essa, essa... morreu, morreu a palavra... morreu a árvore tombada,

fingiam-se amantes abraçados aos pinheiros mansos no recreio da escola, e sempre, e sempre havia uma janela em ruínas, pedaços de lágrimas que sobejavam do sino da Igreja,

ao longe sentiam-se os feirantes que tudo vendiam, e de nada servia gritarem... “Vendem-se Beijos Embalsamados”, porque de beijos, nada, nem o vento, nem o triste amanhecer na boca dela,

 

Desenhei-lhe os lábios na esplanada do falso diamante,

escrevi nos seus seios “AMAVA-TE”..., hoje escrevo, não, hoje nada lhe escrevo, porque o amor desaparece e aparece como as sombras dos barcos em movimento,

recordo o púbis coloidal do imaginado olho de vidro, fundeado na minha mão,

a mesma que depois de suicidada, acariciava-te os esconderijos do néon vaginal,

e assim, ele tinha um coração em pedra, e assim... ele dorme sobre as candeias do luar.

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sábado, 29 de Março de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:24

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