Não cai a noite,
E o céu não tem estrelas,
O espaço fica vazio e o vácuo em quadraturas circunflexas nos braços entreabertos quando o tronco em madeira se afunda no lodo do rio, os braços dele um perfil metálico aparafusado a sábados nocturnos e domingos na cama, uma cruz crucificada disfarçada de homem todo o terreno, tracção às quatro rodas, GPS e computador de bordo, e nos lábios um parafuso em aço a disfarçar o cigarro esquecido no bolso, e o calor é tanto e o calor é tanto que o tronco de árvore começa a derreter, e os braços gravíticos de sorriso lei da gravidade separam-se dos alicerces magoados nas profundezas da terra, as equações da estática tombam e a tensão arterial do esforço transverso esconde-se sorrateiramente entre o esqueleto encardido da pele lilás do eucalipto, doente, do eucalipto encurralado na floresta dissidente de gritos ásperos e afoitados da voz decrépita, e a equação da dinâmica,
- O que é o Amor?,
Uma roda dentada de mão dada com um veio excêntrico,
As carnes aproximam-se e fervem num tacho de alumínio, a liga das meias o elástico que surpreende a energia potencial em sopros a uma folha de papel, e as estrelas começam a elevar-se como grãozinhos de poeira no sentido contrário ao da rotação dos ponteiros do relógio,
- Não cai a noite,
E o céu não tem estrelas,
O espaço-tempo de Einstein em curvas nos seios da manhã, todos os corpos e todos os objectos sugados do hipercubo, e no vácuo o crucifixo pendurado na parede da escola, a fotografia do orelhudo, e uma ardósia com luzinhas que acendiam no escuro, a tabuada do oito aos pontapés à tabuada do cinco, e na prova dos nove sobrava-lhe sempre um,
- Cinco vezes quatro a dividir por dez,
E dois senhora professora,
Que tombam no lodo do rio, os braços, as pernas senhora professora, as pernas que tropeçam no rego de água e atrapalham-se com a rama das batatas, e a cabeça senhora professora, a cabeça está pendurada no recreio junto ao pinheiro,
- Bichos,
Muitos senhora professora,
Muitos dias sentado no mesmo xisto, muitos dias a olhar os mesmos socalcos, e muitos dias o céu sem estrelas, e muitos dias senhora professora, e muitos dias que não cai a noite,
E se cair senhora professora, se cair a cabecinha partida nas pedras da calçada, os caixotes do lixo remexidos pelas mãos dos monstros adormecidos, sem medo senhora professora, sem medo da fotografia do orelhudo que me olha na parede, e com sete anos questionava-me,
- O que faz aquele filho da puta pendurado na parede,
E ainda bem que se fodeu,
Ainda bem senhora professora,
Gostei de a reencontrar senhora professora.