Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

04
Ago 14

O vociferar do teu corpo de anémona-do-mar doirada,

sinto-o nos meus dedos, ele entrega-se às minhas mãos,

desvairado, aparece-me o silêncio mais longo da noite,

não há estrelas que adormeçam a tua pele...

se eu pudesse.... se eu pudesse embrulhava-te no meu olhar,

acendia a lareira dos meus braços...

e... e ficávamos prisioneiros a um livro,

líamos, líamos... líamos até que os cortinados do nosso quarto vomitassem os gemidos de granito dos orgasmos envenenados...

 

E o livro, e o livro ardia,

e a tua pele... e a tua pele... ardia,

 

O vociferar do teu corpo incandescente,

descendo a Calçada da Ajuda...

levavas contigo o rio,

e... e todas as gaivotas de papel,

 

E o livro, e o livro ardia,

e a tua pele... e a tua pele... ardia

num Domingo de cio,

 

Até que eu sentia o teu corpo de cinza na minha triste algibeira!

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Segunda-feira, 4 de Agosto de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:02

12
Mai 11

Dentro dele um electrão percorre-lhe o corpo e esconde-se no peito juntinho ao coração, sente uma picadinha, não dor, caminha até à pedreira, deita-se no chão e adormece.

 

A casa transpira e vê-se o suor impresso nas janelas, e nas cortinas, as cortinas sem fôlego com uma mão a segurar-se ao tecido para se proteger das ondas, quando nas rochas ele em criança quase a afogar-se, escorrega lentamente e desaparece no olhar de um petroleiro que passa lá longe, muito longe, dentro do corredor estreito e infinito, e das imensas portas, umas do lado direito, outras, do lado esquerdo, os olhos abrem-se.

 

Fechar os olhos, chamar os braços que andam em círculo junto ao rio e enrolar-se na tarde que começa a acordar, juntar os joelhos ao peito, dormir eternamente, e o electrão após várias tentativas de fuga começa a erguer-se até às nuvens, e as nuvens lá, construídas de silêncios de algodão e sorrisos de linho, a tarde desprende-se do corredor onde portas caminham junto ao rodapé, e do pai emerge a voz que em pedacinhos de palavras o chama, mas ele não acorda, dorme, sonha,

 

- eu deitado na areia, eu já sem corpo, eu sem nada, eu deitado na areia a sorrir aos albatrozes que caminham apressados pelas ruas da cidade, fumam cigarros compulsivamente, passam por mim, passam por mim como se eu fosse um contentor de lixo, e talvez eu um contentor de lixo esquecido na praia, eu deitado, eu a sonhar.

 

Ele dorme eternamente e sonha, ele a casa que transpira e nas janelas o suor impresso, as cortinas sem fôlego com uma mão a segurar-se ao tecido para se proteger das ondas, e a mão começa a dançar, e a mão deixa de se ver, mistura-se com as ondas, e desaparece do olhar, o corredor vazio, e na casa, na casa apenas as janelas com saudades do electrão…

 

 

(texto de ficção)

Luís Fontinha

12 de Maio de 2011

Alijó

publicado por Francisco Luís Fontinha às 23:09

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