Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

09
Jan 15

(desenho de Francisco Luís Fontinha)

 

 

tento mergulhar nos teus braços

como se eu fosse um deserto esquecido no mapa

como se eu fosse um cubo de areia

ou... ou uma rua sem nome

na cidade que incendeia

e come

as palavras da liberdade

as palavras da madrugada,

o fumo constrói nos meus lábios montanhas de neve

e fios de gelo

lâmpadas de silêncio

e medo...

e tento

tento mergulhar nos teus braços

como uma criança faminta

uma árvore encaixotada

que o Oceano transportou

e perdeu...

num qualquer porto

numa qualquer baía,

e eu

eu não sabia

que os teus braços são de porcelana

que o teu corpo são socalcos olhando o rio...

e poisa na minha cama

em cio.

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sexta-feira. 9 de Janeiro de 2015

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:52

27
Dez 14

Nunca percebi porque choravam os pássaros da minha terra,

nunca entendi porque em determinados momentos...

se abraçavam as árvores da minha terra,

 

desenhava o sol na velha parede da casa que me recebeu,

havia frestas de engano e vidros partidos,

lá fora o frio parecia um rochedo intransponível,

tão alto como a montanha da saudade,

nunca percebi porque era tão fria a minha terra,

esta...

que amo,

mas é tão fria... meu amor...!

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sábado, 27 de Dezembro de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 20:47

20
Nov 13

foto de: A&M ART and Photos

 

o frio gelatinoso dos teus ossos de prata

quando se engrenavam no meu cansado esqueleto de lata

mórbido papel onde jaziam as alegres palavras da madrugada

tínhamos na mão o peso desmesurado da geada clandestina

que o relógio de pulso escrevia na alvorada

as sílabas envergonhadas da musa menina

o frio entranhava-se nos oleosos cobertores de menta

e havia sobre a mesa-de-cabeceira um livro cadáver com sabor a pimenta

a madrugada das palavras congelava como congelam as hélices dos cucos de porcelana...

havia mendigos à procura de uma cama

e tu desproporcionada

envergonhavas as gotículas suicidadas

que a tarde construía nos lençóis de pura virgem lã... doces línguas de desejo

(o frio gelatinoso das engasgadas bocas com flores de lábios charlatães

fundiam como chumbo no cacifo do corredor antes de acordar o pôr-do-sol)

o frio gelatinoso das mãos diurnas aquecem os dedos da palavra apaixonada

vagabundas pernas de aço descendo as calçadas

e no entanto... tínhamos um piano em sexo embrulhado no silêncio beijo

 

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quarta-feira, 20 de Novembro de 2013

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:51

08
Jan 13

Não tenho coisas para te dar

apenas te posso oferecer as minhas mãos gélidas

ou as pálidas palavras cansadas de viver

elas quando emergem sobre a escuridão as tristezas tuas manhãs

o entra e sai da porta sibilada distante

que mente

ausente de ser

outras coisas à janela das minhas pobres gélidas mãos de linho,

 

Nada eu tenho para te oferecer

(já nem os meus livros) gélidas mãos do prazer

queimei todos os papeis frágeis que viviam e dormiam

no meu corpo de pérola cinzenta

lenta

a morte das coisas que tive

e deixei de ter

e não mais voltarei a ver.

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

Alijó

 

publicado por Francisco Luís Fontinha às 19:35

07
Mai 11

A casa a tremer de frio e o meu corpo em suspenso entre a porta de entrada e o jardim, a casa na cama ensopada nos cobertores, enrolada nas sombras da noite, vira-se para a esquerda, vira-se para a direita, dobra-se sobre si, e a casa em suspiros longos, puxa de um cigarro, o cigarro em compasso de espera, acende-se e o escuro apodera-se do fumo, e apaga-se, a casa a tremer de frio, não dorme, e o meu corpo à porta de entrada junto ao jardim, e o jardim aos meus pés acabado de acordar, a casa em convulsões nas frestas interiores, e à janela o mar que espera entrar, não, não o mar, não desistas dos meus braços agora, e a casa na ressaca da noite, treme de frio, ensopada nos cobertores,

 

- não, não desistas de me abraçar, não desistas dos meus braços agora…

 

Ensopada nos cobertores, a casa treme de frio, levanta-se, veste-se, abre a porta… e quando me apercebo está à minha frente no jardim ensonado, está magra, desossada, os braços picados pelas abelhas e a casa não um malmequer, a casa uma casa, que em pleno verão treme de frio, sobretudo cinzento nos ombros, e não pára de correr, e em círculos concêntricos gira em meu redor, parece a terra em movimento de rotação em volta da lua, eu, eu a tremer de frio, a casa,

 

- não, não desistas de me abraçar, não desistas dos meus braços agora…, no guarda-fato o meu esqueleto incompleto à espera das frestas da casa e do inverno que de vez em quando poisa no jardim, baixo-me, pego numa flor, e percebo que a flor com medo do meu corpo, da casa, de nós,

 

A casa treme de frio enrodilha-se nos cobertores da madrugada, engasga-se na tosse, não dorme, não come, pesam-lhe os braços quando alguém acende a luz do quarto, e esqueci-me, esqueço-me que a casa com diarreia, caminhadas infundadas até à casa de banho, diarreia e vómitos, eu transpirava, eu tinha frio, eu ontem, eu há dezassete anos, precisamente a 7 de Maio de 1994, a esta hora a casa, a casa a estrafegar um grama de heroína, e depois, e amanhã?

 

- E hoje? Hoje não heroína, hoje nunca mais heroína, hoje eu sentado junto ao mar à espera que ela,

 

Ela vai-lhe crescer o cabelo, pegar na minha mão e levar-me para casa,

 

- não, não desistas de me abraçar, não desistas dos meus braços agora…

 

 

 

(texto de ficção inspirado no dia 7 de Maio de 1994)

Luís Fontinha

7 de Maio de 2011

Alijó

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:10

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