Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

28
Mar 15

Adormecido nas ostras marés da serpente de prata, para o inferno…

E,

Não, filho!

A guerra foi perder tempo, corpos, estórias e memórias, o meu melhor amigo

Morto!

O caixão entre quatro tábuas de sofrimento, a algazarra da embriaguez ouvia-se nos poemas em círculo, a fogueira incendiava a paixão,

Dispo-me?

Não, filho!

Promessas,

Dispo-me, olho-me no espelho do enterro, ele

Não,

Ele de espingarda ao ombro, imaginava-se um soldado de chocolate, sentia dentro do seu peito cada disparo, cada dor, cada…

Fugiu!

Ontem, ao final da tarde, a viagem até ao ninho das cegonhas negras, descia a noite sobre o capim dos beijos analógicos,

Na parede,

Fugiu…

Os ponteiros mergulhados numa poça de sangue, a lápide esperava-o na aldeia, o meu pai

Coitado,

Sentado numa cadeira a vender seguros de vida, falsos, claro

O telegrama,

Morto em combate,

Claro, amanhecia e ele sentia-se um peixe perdido nos fósforos do desejo, e a morte mesmo ao seu lado…

 

 

(ficção)

Francisco Luís Fontinha - Alijó

Sexta-feira, 27 de Março de 2015

publicado por Francisco Luís Fontinha às 00:51

25
Mar 15

O exílio disfarçado de madrugada, alguns papeis, livros poucos, um retracto do meu avô e… e nada mais do que isso, Margarida chorava com a minha partida, eu, finalmente em liberdade,

Os panos,

Os cortinados envernizados de saudade

Pai, regressaste?

Não, filho!

A morte não tem regresso, os cortinados envernizados de saudade, a manhã despedia-se do paquete que me transportaria

Para o inferno,

Que me transportaria para o infinito beijo do capim, sonhava com lobos, coelhos e cobras

Cobras?

Serpentes engasgadas pela ventilação mecânica dos fósforos sem memória, esquecem-se dos cigarros sobre a lápide, a fotografia, e

Não, filho!

Para o inferno…

 

(ficção)

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quarta-feira, 25 de Março de 2015

publicado por Francisco Luís Fontinha às 01:06

22
Mar 15

O meu melhor amigo, morreu

Maldita guerra, terra... nada, para nada, recordo o sorriso dele, em criança brincávamos junto ao mar, desenhávamos barcos nas paredes do sono, sentados, pintávamos beijos no térreo chão com odor a desejo, Margarida

Farta das cartas, meu amor, amo-te, ando no mato e percebo que a tua sombra me acompanha, sinto os teus doces lábios no cano da minha G#. bê lá, meu amor,

Margarida, desenho no cano da minha espingarda... Amo-te...

O meu melhor amigo, a criança de sorriso encarnado que todas as tardes voava sobre os nossos cabelos de espuma...

 

 

(ficção)

Francisco Luís Fontinha - Alijó

Domingo, 22 de Março de 2015

publicado por Francisco Luís Fontinha às 00:59

21
Mar 15

Não, não amanhã, amanhã vou à cidade, deixar o meu cadáver para ser enviado para a Metrópole, uma ardósia no peito, 123768979/66,

Só isso, pai?

Só isso, quando chegamos,nada tínhamos, apenas um caixote de nada, um rio nas veias... e tu

O mar, pai?

Morreu, disseram-me..., não percebi, morte!!!!!

O que é a morte, pai?

Voar, 123768979/66... em combate, o silêncio do Grafanil, os sorrisos das mangueiras nos meus lábios,

E...

Pai?

Sim, filho, Margarida reaparece da escuridão, tinha como hábito brincar na areia branca da praia dos sonhos,

Mãe, o pai?

Ficção, tudo isto, nada, a dor, acordava de madrugada a gritar por granadas, G3 e literatura, literatura, mãe?

Poesia, textos, trazia na algibeira da farda...

Farda, mãe?

Poesia, textos, trazia na algibeira da farda... toda a sua estória, as canções de menino, os primeiros beijos,

Margarida?

Sim António...

Viste os meus livros de “AL Berto”?

Talvez no chão, a carta, o sorteio

Três milhões de mortos,

Mortos?

Não, mortos não, Euros

Três milhões de Euros, meu filho?

Sim, mãe, sim...

 

 

(Ficção)

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sexta-feira, 20 de Março de 2015

publicado por Francisco Luís Fontinha às 00:32

19
Jul 14

Sábado,

a metralhadora do silêncio começa a disparar,

uma mulher vestida de negro, caminha vagarosamente para o altar,

alguém a espera, alguém a ama, e só alguém a pode desejar,

sábado,

hoje não há palavras de escrever,

hoje só uma ténue lâmina de sémen suspensa na janela da cidade com chaminés de vidro,

ela dispara, ela mata... e depois, depois cessa... depois... depois abraça-se às feridas que choram,

hoje, sábado, a metralhadora do silêncio começa a disparar...

a tarde escoa-se através de uma conduta de beijos, e há os cabelos da noite enrolados no vento,

a mulher leva um livro na mão, uma bala que lhe dita o futuro não existente,

ela deita-se sobre a lápide da solidão, e espera, e espera...

 

Espera que um coração de papel acorde da ressaca de sexta-feira,

 

Sábado,

um dia invisível,

chuvoso,

a cidade com chaminés de vidro, arde,

e sente,

os estilhaços no corpo de uma criança,

 

ASSASSINOS!

 

Sábado prometido,

hoje, hoje, hoje o que posso eu dizer...

que invento mulheres vestidas de negro?

que há metralhadoras apontadas ao meu peito?

Sábado...

ASSASSINOS!

 

Os meninos,

brincam no centro do furacão,

os calções fendidos, os calções de chocolate baloiçando nas pernas íngremes da madrugada,

e sábado..., e sábado os ASSASSINOS...

saciam-se à volta de uma mesa redonda, recheada de comida,

e os meninos, morrem,

e os ASSASSINOS... e os ASSASSINOS escondem os sobejantes calções de chocolate,

e ninguém, e ninguém os consegue parar...

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sábado, 19 de Julho de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 19:57

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