Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

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Dez 12

(21 de Dezembro de 2012, 02:35 horas)

 

Não sobrou nada para nós, dizias que ele era um oceano de luz entre quatro paredes de vidro, mas ela não queria acreditar, o fim do mundo?

existe o mundo? Perguntava a minha avó quando subia connosco ao cimo da montanha, e olhando em redor,

 

tão grande o mundo,

 

e apenas uns miseres quilómetros quadrados, depois, o mar dentro das jangadas de xisto que deambulavam em circunferências concêntricas até desaparecerem no limite do pôr-do-sol quando o olhar da mulher que vivia no rés-do-chão direito, da rua da alegria, tendia para zero, confundia-se às vezes

 

mais ou menos infinito,

 

o fim do mundo espelhado no tecto da igreja abandonada pelas pessoas da aldeia, mentias-me quando chegavas a casa de dizias-me que vinhas da missa, eu, fingia acreditar e pensava

 

mas ele não é Ateu?

 

Não, sobrou nada para nós, ouvias-me fingindo que acreditavas em mim, perguntava-te

 

não acreditas em mim? Sorridentemente dizias-me Claro que sim meu querido amor, claro que sim, tão grande o mundo, as palavras, as azeitonas sobre a mesa da cozinha, completamente sós, abandonadas pelas mãos da minha avó, que subia connosco ao cimo da montanha, e olhando em redor

 

tão grande o mundo,

 

tão azul, tão, como diria o meu grande amigo, tão clandestino como as asas dos plátanos, ninguém, entre noites e muros de vedação, ninguém acreditava

 

acaba agora o mundo...

 

mas ele não é Ateu?

 

Claro que é, mas para efeitos normativos, para enganar a mulher, enquanto ela o espera

 

será que o espera?

 

Ele faz o sacrifício de todas as noites ir à missa deita-se de barriga para o céu e começa a contar as estrelas, e quando as fotografias da amante começam a colarem-se-lhe no corpo esbranquiçado de incenso, parte, para longe, e chega a casa

 

desculpa amor, o sacerdote chegou atrasado, e ela não queria acreditar, o fim do mundo?

 

acaba agora o mundo...

 

mas ele não é Ateu?

 

Não é, foi, agora é de todas as crenças, talvez alguns dos outros deuses lhe valham, e o fim do mundo

 

não acabou, vês meu amor querido,

 

e sinceramente eu não via nada, pesava-me a cabeça, cambaleava quando entrava em casa, ela esperava-me, ele esperava-me,

 

só agora, eles para mim,

 

e logo agora

 

e sinceramente eu não via nada, pesava-me a cabeça, cambaleava quando entrava em casa, ela esperava-me, ele esperava-me, e logo agora que fiquei sem cigarros, e logo agora

 

só agora, eles para mim,

 

a mulher, a amante da mulher, o sacerdote, o sacristão, e eu

 

Não sobrou nada para nós.

 

(texto de ficção não revisto)

 

@Francisco Luís Fontinha

Alijó

publicado por Francisco Luís Fontinha às 20:16

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