Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

05
Out 11

Qualquer coisa de estranho na minha voz

Quando alicerço os meus olhos nos malmequeres

Que dormem junto ao cais

 

Qualquer coisa esquisita na minha mão

Um cansaço silencioso

Dentro do meu peito

Quando a coisa estranha da minha voz

Sobe ao cume da montanha

E o rio desce ruidosamente

E ninguém o a apanha

E sem jeito

Abraça-se ao mar

 

E nas estrelas um sorriso de gente

Lábios de menina nas gaivotas de amar…

Enrodilham-se os malmequeres que adormecem junto ao cais

Nos versos entalados no luar

A menina esconde-se nos lençóis de relva fresca da manhã

E dos versos acordam as silabas embebidas na maré

 

Baixo os braços

E cerro hermeticamente

Os lábios da noite

E funde-se um protão

Dentro do meu peito

E o meu corpo fica escuridão

Um buraco negro mergulhado nos malmequeres junto ao cais

Os que dormem

E sonham

E amam todos os pássaros do céu.

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:15

08
Set 11

Um murmúrio interrompe a noite, dos lábios dela as ondas do mar em silêncios e flores que se despregam aos bocadinhos e se disfarçam de beijos, os beijos evaporam-se entre as mandibulas das estrelas e a lua, e junto às rochas os chinelos dela poisados sobre o sorriso de uma gaivota, a areia molhada, a impressão dos pés no soalho da praia, e enquanto caminha o vento faz balançar-lhe a saia de ganga,

 

- A menina olha-me e percebo que dos olhos dela acorda o espanto, e percebo que dos olhos dela subtrai-se a admiração, e talvez se questione, julgo eu pelo sorriso que lhe cresce nos lábios, ela pergunta-se Quem será esta ave de rapina que a esta hora caminha junto à praia, e só, simplesmente só, e nem a sombra o acompanha?, e eu, eu repondo-lhe com um sorriso que nunca ando só e não sou ave de rapina Nunca ando só e não sou ave de rapina!, olhem-me esta miúda, ave de rapina…, eu nem sei voar,

 

Os chinelos tombam do sorriso da gaivota, e adormecem sobre a peugada esquecida na areia, e algo está errado, porque se os chinelos são dela e a peugada na areia lhe pertence, Porque não coincidem chinelos e peugada,

 

- Oiço uma voz Estás maluquinho, meu querido!, e não bastava eu ser ave de rapina, e não bastava eu não conseguir voar, agora, agora também sou maluquinho, e daqui a pouco dizem-me que estou a sonhar Estás a sonhar, rapazinho!, qual mar, qual praia, ave de rapina e gaivotas, chinelos e peugada, e oiço outra voz Estás maluquinho, meu querido!,

E inclino-me sobre o meu lado direito, e o mar travestiu-se de estante, a peugada e os chinelos de mão dada aos livros, e as gaivotas e a ave de rapina encolhidas nos cachimbos,

E ela tem razão, e esta miúda é mesmo esperta, E queres ver que estou mesmo maluquinho?,

 

Um murmúrio interrompe a noite, dos lábios dela as ondas do mar em silêncios e flores que se despregam aos bocadinhos e se disfarçam de beijos, os beijos evaporam-se entre as mandibulas das estrelas e a lua, e malmequeres caminham junto à praia, a água bate-lhes nos pezinhos, sentem um silencioso arrepio e saltitam sobre a areia ainda quente,

 

- Cerrar os cortinados da noite, e sobre a cama puxo os lençóis de espuma, cubro-me com o mar, ela apaga o candeeiro de estrelas, e quando lhe pego não mão o mar encostado ao meu peito adormece, e brinco com os lábios dela,

 

Sentem um silencioso arrepio e saltitam sobre a areia ainda quente, e em espaços desordenados desaparecem sobre o mar…

 

(texto de ficção)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:48

04
Mai 11

Desço a encosta e finto as rochas de xisto, tropeço, levanto-me com sacrifício até chegar ao rio, sinto-me cansado, preciso urgentemente de me sentar e olhar a corrente, pegar na minha mão e chapinhar na água límpida da manhã. Sorrio e fecho os olhos, abro os olhos e vejo-me no espelho do rio, o meu rosto não eu, o meu rosto um ramo de flores, fico com medo, e percebo que durante a noite alguém substituiu o meu rosto envelhecido por um ramo de malmequeres. E agora o que faço?

 

- E agora o que faço? Encosto-me à paisagem e dos meus olhos emergem lágrimas de pólen e aos poucos deixo de ver as nuvens, e tenho a certeza que uma abelha poisa no meu rosto de malmequer, eu não eu, eu um ramo de malmequeres cortados durante a noite enquanto lutava com uma aranha que invadiu o meu sono, e começo a sentir nas costas as pedrinhas da encosta, apenas oiço o rugido da água e peixes em saltos acrobáticos voltando novamente a mergulhar na água e desaparecerem dos meus ouvidos, e deixo de ter silêncio.

 

E agora o que faço?

 

Sorrio e fecho os olhos, abro os olhos e vejo-me no espelho do rio, um cigarro alimenta-me e por momentos esqueço que o meu rosto envelhecido é um ramo de malmequeres, pergunto ao rio, pergunto-me a mim, e quando os malmequeres deixarem de ser malmequeres, e quando o poema deixar de ser poema e as palavras o rugido da água e peixes em saltos acrobáticos voltando novamente a mergulhar na água e desaparecerem dos meus ouvidos, e deixo de ter silêncio, e deixo de ser eu…

 

- E agora o que faço?

 

 

(texto de ficção)

Luís Fontinha

4 de Maio de 2011

Alijó

publicado por Francisco Luís Fontinha às 11:58

11
Mar 11

Os malmequeres que eu pensava

Ter no meu jardim, hoje, não estão,

E hoje está sol

E hoje sinto um leve aperto no coração,

 

Talvez porque os malmequeres me deixaram,

Talvez porque hoje está sol e eu não flor,

Eu uma sombra perdida ao fundo do mar,

E os malmequeres hoje com dor,

 

E no meu jardim, não.

 

E hoje o meu jardim deserto

Despido na manhã sem malmequeres,

 

Os malmequeres que eu pensava

Ter no meu jardim, hoje, não estão,

Procurei-os por entre as pedrinhas,

E os malmequeres deixaram-me na solidão…

 

 

 

Luís Fontinha

11 de Março de 2011

publicado por Francisco Luís Fontinha às 12:06

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