Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

23
Jul 17

Batem à porta,

Não vou abrir…

Nada espero, ninguém me espera…

Neste fim de tarde junto à janela.

Sentado.

Não me levanto,

Olho o relógio e são dezoito horas,

Tempo necessário para ir à doca e abraçar-me ao barco dos teus braços,

Batem à porta.

O silêncio constrói-se em mim com uma cabana na montanha,

Sinto o mar dentro do meu corpo indefeso,

Quando regressa o pôr-do-sol…

Batem à porta,

Não vou abrir…

Nada espero…

A não ser ficar aqui sentado.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha

Alijó, 23 de Julho de 2017

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:20

01
Mar 15

Não quero ser como tu,

uma cratera de palavras,

invisíveis,

e mortas,

não,

não quero pertencer às tuas mãos,

não,

não quero poisar no teu peito envenenado pelo silêncio de pedra,

e às vezes, sem o saber, escondo-me na tua sombra,

como um rio amachucado,

dentro de uma folha em papel...

como um rio engasgado nos rochedos da melancolia,

hoje, Domingo, Março, primeiro dia...

de quê?

da tristeza?

ou... ou do inferno entardecer vestido de cidade...

ruas,

automóveis enlouquecidos correndo até ao mar,

avenidas e ruelas,

Março,

primeiro dia...

não,

não quero ser como tu...

um calendário pendurado numa das quatro paredes do abismo,

sem coração,

sem pálpebras de nada quando acendes a luz e a literatura voa nos nossos corpos,

somos dois pontos esquecidos no espaço,

um buraco negro,

corremos em direcção à estrela mais próxima...

e acordam as cinco primeiras canções das estátuas de pedra,

há no teu olhar as sete imagens da seara do sono,

e dos sonhos vejo os transeuntes procurando a sombra do pôr-do-sol,

estás triste, hoje,

primeiro dia,

Março,

e sem o saber... hoje é Domingo...

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 1 de Março de 2015

publicado por Francisco Luís Fontinha às 20:27

23
Dez 14

(recordações de 1987/1988)

 

 

Deixei de te ouvir,

cessaram os lamentos dos teus lábios

que brincavam nos finais de tarde junto ao Tejo,

desenhávamos barcos no sorriso do pôr-do-sol...

e havia sempre uma bandeira poisada nos nossos ombros de granito,

deixei de te ouvir,

encostei a cabeça ao teu peito...

e juro... e juro que desde então oiço todas as manhãs o mar dentro de mim.

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 23 de Dezembro de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:51

01
Set 14

Pediram-me silêncios...

e eu, nas nuvens amarguradas da tempestade da insónia,

desenhei... gritos,

transformei abraços em pedaços de madeira,

escrevi beijos em bandejas com flores grisalhas,

tinham cabelos cinzentos,

os homens das esplanadas inventadas,

depois... depois sentei-me no pôr-do-sol,

chamei a mim a tristeza do fim de tarde,

peguei num cigarro quase moribundo... e vi-o morrer nos meus dedos,

sentia-lhe os últimos desejos,

sabia que pouco tempo depois morreria como um desprezado,

como tantos homens morrem,

como tantas crianças nascem...

como tantos cinzeiros esquecidos num roseiral,

pediram-me silêncios...

e pintei nas pratas enroladas do invisível desassossego,

bolhas castanhas com odor a calafrios...

o corpo emagrecido rangia,

os alicerces destruíam-se enquanto o vento se escondia numa locomotiva abandonada,

sem percebermos que nunca existiu um ponto fixo de chegada,

havia lanternas com dentes de marfim,

tínhamos no sótão um guindaste de brincar,

abríamos a janela,

e puxávamos o mar,

só para nós...

até que uma fina película de cacimbo comeu-nos as bolhas castanhas...

o corpo começou a arder,

os braços ancoravam-se aos indolentes amanheceres...

vi uma luz que vivia dentro de uma caixa de vidro,

acenou-me... e no tecto começaram a nascer gaivotas,

ouvíamos os apitos dos barcos de papel,

e nenhum marinheiro se atreveu a resgatar-nos dos gritos das bolhas castanhas...

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Segunda-feira, 1 de Setembro de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:36

14
Ago 14

Uma casinha habitada por pequeníssimas lâminas de papel,

um coração de cacimbo voando sobre as sanzalas com telhados de insónia,

um homem, um poeta..., e a amante do poeta,

um corpo pendurado na preia-mar,

que espera o regresso do sonâmbulo cansaço da madrugada,

o silêncio disfarçado de mendigo passeando-se pelas ruas da cidade,

uma janela que nunca, que nunca se abre,

um poema nas mãos da clarabóia com braços de luar,

uma casinha,

e lâminas de papel,

um sorriso, um desejo... e três círculos de luz nos lábios do pôr-do-sol,

o sonho...

 

As paisagens pigmentadas nas paredes da casinha,

as palavras acorrentadas no estendal poético,

uma eira deserta, uma eira de vinil girando na noite...

e o sonho,

e o lugar que me falta alcançar antes de morrer,

a escola morta, a escola um amontoado de escombros,

cadernos apodrecidos,

quadriculados momentos que ficaram sob a árvore de sisal,

um menino brincando com um velho “chapelhudo”...

e um triciclo com o assento em madeira,

o mar, o mar do Mussulo em tracejadas rotações de amar,

no sonho, no sonho de voar...

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quinta-feira, 14 de Agosto de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 19:29

05
Abr 14

Os muros da tua insónia servem para me ausentar dos teus beijos,

tenho medo das tuas mãos, e do teu sorriso, e dos... medo dos teus olhos de andorinha de papel,

os muros da tua pele são como o Pôr-do-Sol..., sento-me e imagino-me dentro do Oceano,

procurando algas, procurando barcos em esferovite... e coisas sem sentido, como os teus lábios,

cansados,

tão cansados que são eternamente sonhos,

pedras,

janelas com figurantes vestidos de neblina,

sandálias,

pernas,

as mãos da andorinha de papel...

procurando-me enquanto imagino o meu corpo prisioneiro no Luar...

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sábado, 5 de Março de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 15:32

02
Fev 14

foto de: A&M ART and Photos

 

Círculos, círculos de ténue luz sobre os teus olhos cinzentos,

lá fora ouve-se o granizo comendo os sonhos daqueles que dormem, e saltitam sobre as nuvens de vento,

lá fora há pálpebras que choram,

automóveis que se recusam a andar,

suspendem-se nas canadianas, procuram de vez em quando uma bengala de verniz...

lá fora tudo parece ser feliz, as plantas argumentam nas palavras os distintos sons dos teus lábios,

círculos,

quadrados,

quarta-feira... a luz inverna e todos os silêncios ancorados a ti,

tu, quem és?

tu... tu o que fazes junto a mim quando me olho no espelho, quando descrevo as nódoas do meu rosto por meia dúzia de palavras, tão poucas... mínimas... que apenas pronuncio... “ausência e dor”,

e círculos..., círculos viciados em sexo e drogas, deitados na relva do pôr-do-sol,

e... e círculos, círculos de ténue luz sobre os teus olhos cinzentos.

 

 

@Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 2 de Janeiro de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:46

27
Out 13

foto de: A&M ART and Photos

 

percebo pouco dessas coisas do amor

lexical... sou um desamor

desalmado

desiludido

cansado

sou um estupor

fingidor

percebo pouco dessas coisas do amor

 

percebo

pouco

e construo palavras com réstias de cinza dos barcos a vapor

percebo pouco dessas coisas do amor

da paixão

e do coração de uma gaivota com seios de pôr-do-sol... percebo pouco

dessas coisas sem motor

nas mãos de um louco

 

percebo pouco dessas coisas do desejo

do beijo

e das lágrimas em flor

percebo tão pouco dessas coisas do amor...

ai o amor...

ai e ai

e não vem e não cai

como sanzalas na lareira tuas coxas sem sabor

 

sem as palavras do amor

que eu não percebo nada

não entendo

não sei o significado de janelas com vidros de prata

não percebo nada dessas coisas do amor

dos telhados em lata

em chapa

o amor como tuas lágrimas que jorram na madrugada

 

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha – Alijó

Domingo, 27 de Outubro de 2013

publicado por Francisco Luís Fontinha às 19:28

05
Ago 13

foto de: A&M ART and Photos

 

não sabes que o tempo mata

e a saudade vem

como a chuva depois da tempestade

como o vento velozmente nos teus lábios,

 

não

não sabes que

mata

o tempo

a saudade

a insónia

não sabes que da noite vêm as tuas mãos acariciar a minha face em migalhas de xisto

triste

vadia

perdidamente só como as árvores quando dormíamos na floresta dos sonhos

depois de fazermos amor

tínhamos a miudinha chuva onde nos embrulhávamos como lençóis de água salgada,

 

galgando muros

terrenos indomáveis

silêncios

amores

e barcos

fundeados na paixão fumegante dos cigarros invisíveis,

 

(não sabes que o tempo mata

e a saudade vem

como a chuva depois da tempestade

como o vento velozmente nos teus lábios)

 

Deitas-te sobre a areia vermelha

desenhas-me no chão húmido em finos traços de carvão

há em ti uma tela esbranquiçada

doente

falida

amada,

 

amas sei que amas

e sofres

porque sofres

porque és o mar

desenhas-me e deitas-te sobre a areia vermelha

iludes-te

e desiludes-me

como uma criança sem perceber que o Pôr-do-Sol é de chocolate...

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha – Alijó

publicado por Francisco Luís Fontinha às 23:19

01
Jun 13

foto: A&M ART and Photos

 

Talvez um dia percebas porque dançam as minhas lágrimas

e navegam nos meus débeis braços os barcos de vidro martelado

talvez um dia entendas as personagens de mim

que são de ninguém

como sombras bailando debaixo da chuva

assim

como palavras entre linhas de um caderno negro

e os carris da saudade em direcção à minha caneta de tinta permanente

 

Talvez um dia o mar seja o nosso reencontro no mergulho do desespero abandono

que todo o pôr-do-sol sofre antes do cair a noite

e acordem milhões de parvas estrelas

que não falam

não escrevem

talvez um dia venhas a perceber quem sou eu

do que padece o meu empobrecido esqueleto

como um texto com duzentos e seis caracteres

 

Talvez... as minhas lágrimas

e navegam nos meus débeis braços os barcos de vidro martelado

que dos pomares de areia com sabor a amêndoa

do outro lado da janela

um menino embalsamado brinca com um parvo boneco

de nome chapelhudo

e talvez um dia um dia acordem as neblinas imagens de ontem

com as perfumadas sílabas de hoje...

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:25

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