Acrílico s/tela 70x100 – Francisco Luís Fontinha
Um silêncio de espuma poisa suavemente no teu olhar, a manhã fria, passeia-se pelo jardim imaginário da sombra, o perfume do teu sorriso vagueia, lentamente, nas amoreiras em flor, cansada, a manhã, alicerça-se aos braços do poeta, que incendeia palavras junto à árvore do silêncio,
Ouves-me?
Grito.
O grito da corça, o vai-e-vem dos sons melódicos do desejo quando abraçam o corpo camuflado no silêncio de espuma, as flores, o amor quando as flores brincam na eira granítica do sono e, ao longe, o tão esperado fim-de-semana,
Amanhã, vens?
A sepultura do esqueleto ósseo dorme, as lâmpadas da noite, em queda livre, suicidam-se nos pequeninos pedaços de papel que o poeta amarrotou durante a tarde,
Sombras de néon sombreiam o teu no corpo embalsamado pelo silêncio, aquele de espuma, que habita na cidade dos pássaros,
Flores, meu amor, são apenas flores…
E, ninguém sabe a que horas abre o jardim do descanso, com banquinhos de madeira cansada pela tempestade da tarde,
Amanhã, vens?
Claro que sim,
Flores, donzelas, meninos e meninas, o circo chegou à cidade dos pássaros e, os pássaros, todos eles, vestiram-se de palhaço; o pobre, o rico e, o grande palhaço do Reino, que existe, mas que ninguém conhece.
Abrem-se ranhuras no gesso fendido da madrugada, todos os gemidos nocturnos, de variadas cores, alimentam o orgasmo imbecil da esperança, acreditava em pássaros, meu amor,
Amanhã, mãe?
Ai o amor, meu querido, quando dormes sobre uma lâmina de granito, encostas a cabeça ao meu ombro, depois desces a calçada em direcção ao rio e, beijas-me loucamente,
Acreditas no destino, meu amor?
Talvez meu filho, talvez,
Um zero à esquerda, sentou-se sobre o paralelepípedo do sono e, embarcou numa jangada para a ilha dos amantes.
Hoje, sou um pedaço de silêncio de espuma.
Francisco Luís Fontinha
Alijó, 11 de Agosto de 2020