Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

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Abr 11

Saberás perdoar-me quando o vento entrar pela janela, e na rua as ruínas, pedacinhos de ti vaguearem pelo pavimento e das tuas penas brancas silêncios de nada acordarem na madrugada, saberás perdoar-me quando a janela se fechar, quando nos vidros alguém escrever fim, e no soalho junto à praia o teu corpo esconder-se nas algas, enrolar-se nas sombras, e da maré, da maré acordar o monstro que sou eu, com asas, e uma cabeça de vidro, três pernas de madeira e braços de cetim…

- o mar espera-me junto à janela virada para a noite, e nas pernas sinto o medo de caminhar, estou cansada, vagueio pelo pavimento em pedacinhos de ti, das tuas mãos de madrepérola o meu rosto se sacia como um seixo junto à ribeira pronto a ser manuseado, e eu deitada no soalho junto à praia, quase no fim das horas, quando os segundos se esgotam na madrugada, e não fim, não mar, o recomeço da noite à espera de um novo dia, o teu cão impaciente com o luar, e tu,

Saberás perdoar-me quando o vento entrar pela janela, e na rua as ruínas, os caixotes do lixo atulhados à minha espera, e eu também lixo, encaixotado no contentor da saudade, também eu vagueio pelas ruas no trilho de uma janela aberta junto ao mar, olho os barcos que fazem amor no cais, amam-se, o corpo em suor coberto pela neblina, os lábios em fogo percorrendo cada milímetro quadrado do sexo à mercê de um desejo, os barcos enlouquecidos, os barcos esquecidos na noite, e pela janela chamas-me, envias-me um silêncio, e eu,

- e eu à espera que o cigarro se apague e o teu corpo poise nos meus braços, e eu à espera que nos teus lábios cresçam jasmins e na tua boca a janela para o mar, os barcos cansados, os corpos misturados com o sémen da noite, e eu à espera que o teu corpo entre dentro do meu, sorria quando um petroleiro entra na barra, e eu à espera,

E eu à espera que o cigarro se apague e o teu corpo poise nos meus braços, deitar-te na cama devagarinho, e na rua as ruínas, pedacinhos de ti vaguearem pelo pavimento, e eu à espera que a tua roupa comece a voar pela janela em direcção ao mar, e em ti o meu corpo à procura do teu, no divã é noite, os pássaros novamente pendurados nos teus braços, os corpos misturados com o sémen da noite, e eu à espera que o teu corpo entre dentro do meu, e a minha cabeça de vidro iluminada pelo luar…

- Saberás perdoar-me quando o vento entrar pela janela,

E a janela encerrada, fechado para obras, remodelação do nosso espaço comercial, seremos breves, pedimos desculpa pelo incómodo, saberás perdoar-me quando o vento entrar pela janela, e da minha mão de madrepérola uma rosa acariciará os teus lábios, os teus doces lábios…

 

 

(texto de ficção)

FLRF

10 de Abril de 2011

Alijó

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:41

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