foto de: A&M ART and Photos
qualquer coisa começada em pedra e terminada em erva
o terreno límpido onde pastam as vozes dos cortinados ensanguentados
húmidos pelo medo
às paredes o silêncio degredo
a morte vestida de flores embalsamadas
e portas encerradas
janelas que olham o mar
o mar que transforma janelas em barcos para brincar
qualquer coisa em ti
comedida
a dor sobre os teus ombros submersos em carris de aço nos lânguidos lábios em tristes abraços...
sabia-te deitado no meu destino,
ancorado
e bem amarrado como cordas que sustentam as pontes invisíveis das tempestades de veneno
converso e oiço-te em mim...
grito.... “Quero o meu caderno das argolas desbotadas quando a tarde ainda era tarde”... grito e quero-o em mim como se eu fosse um simples suporte de madeira deixado numa qualquer rua da cidade...,
a cidade fervilha e transpira
o corpo despe-se e do espelho do sótão uma lâmina de tristeza embrulha-se em ti
sim eu percebo que você é frágil e de frágeis vivem os jardins como vivem as árvores nos seios das pequenas gaivotas em papel...
a cidade és tu
o corpo é o meu
o meu corpo dentro do teu corpo
dois corpos suspensos na fronteira do prazer... vivemos na alegre solidão da dor...
sinto-as como se fossem as minhas mãos de amoreira em cima das nuvens negras do Inverno inferno travestido de Cinderela adormecida... ancorado... e bem amarrado... o teu corpo vive e habita nos rochedos das montanhas encarnadas
o teu corpo masturba-se nas sílabas assassinadas pela madrugada
oiço-as e invento-lhes nomes para que eu não enlouqueça como a insónia vogal do ciume
vive-se vivendo como esqueletos de ossos em migalhas de pão...
voa-se voando... quando de um corpo sem corpo acordam as sanzalas do pecado.
@Francisco Luís Fontinha – Alijó
Domingo, 19 de Janeiro de 2014