Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

02
Out 15

Meu amor,

Quando os teus seios dormem suspensos nos socalcos do Douro

E o Rio se perde na última curva do anoitecer,

Invento-te,

Escrevo-te…

Faço-o sem o saber,

Ou querer…

Sentir em mim as tuas mãos de xisto lacrimejante,

Sentir em mim os teus lábios de uva mendigando os meus lábios de luar…

Meu amor,

Quando o teu olhar se esconde no Pôr-do-sol,

E uma gaivota alicerça-se ao meu peito,

Sinto o teu perfume vaiado sobrevoando todos os cadeados do teu corpo…

Ai… ai meu amor,

Este sol,

Este Rio…

E estes barcos em papel,

Inventando sorrisos nas lâminas da paixão.

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sexta-feira, 2 de Outubro de 2015

publicado por Francisco Luís Fontinha às 21:38

21
Jul 15

A velha estrada em direcção à morte,

Os plátanos das tuas pálpebras,

Cansados,

Tristes,

Revoltados de tanta geada

E tempestades de noite,

Inventas o sono

Nas paredes escuras do sofrimento,

Dormes,

Habitas neste cubículo como se fosses uma sombra envenenada pelo silêncio,

Lá fora,

Pássaros à tua espera,

E da velha estrada

Chegam a ti os Oceanos de prata

Que ofuscam o teu olhar,

Um soldado perde-se nas margens do Tejo,

O caderno acorrentado à mão

Vagueia sobre os cinzentos espelhos da dor,

E todas as palavras voam sobre os esqueletos de papel

Que brincam no teu peito,

A janela do teu quarto encerrada,

A porta dos vinhedos descendo o Douro,

Também ela…

Encerrada,

Não há um número nos seus braços,

Incógnitas manhãs sobre um lençol de linho,

As flores queixam-se da tua alegria,

Cessou,

Como cessaram as pontes para a outra margem…

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Terça-feira, 21 de Julho de 2015

publicado por Francisco Luís Fontinha às 19:15

03
Jan 15

(desenho de Francisco Luís Fontinha)

 

 

estas mãos se cruzam no Oceano tua pele

mergulhando nas tuas pálpebras de madrugada

estas mãos te amam

e acariciam

nas tardes envenenadas pelo desejo

estas mãos de ninguém

com todos os cheiros da sanzala

estas mãos de ninguém

com todos os sons do amanhecer

que só o perfume de uma rosa consegue desenhar

e... e escrever

nas sombras do mar

estas mãos se cruzam no Oceano tua pele

que o barco do meu amor suavemente desliza...

como todas as palavras soltas

como todos os vinhedos suspensos no sorriso de uma enxada

estas mãos te amam

e acariciam

estas mãos de ninguém

que o tempo come

e despoja as suas cinzas no cemitério nocturno das gaivotas sem nome...

estas mãos

estas mãos se cruzam

quando todas as luzes se apagam e todos os corpos morrem...

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Sábado, 3 de Janeiro de 2015

publicado por Francisco Luís Fontinha às 19:40

03
Dez 14

Inventei-te numa noite de solidão,

escrevi o teu nome fictício numa muralha de xisto

que a tempestade tombou,

havia no teu olhar socalcos cansados

e vinhedos sombreados

de... paixão...

 

Havia na tua mão

uma carta por escrever,

e lá dentro...

um beijo,

um beijo desenhado no meu sorriso

com lágrimas de sofrer,

 

Inventei-te numa noite de solidão,

abri os cortinados e olhámos as estrelas de papel crepe...

havia luar nos teus cabelos

e neblina cinzenta nas tuas pálpebras de adormecidos rochedos,

e quando me abraçaste... a cidade morreu,

como morreram todas as cidades onde habitámos,

 

hoje, somos dois esqueletos vadios...

vagueando pela embriagada poesia de um louco,

dois pássaros sem árvores para poisar...

hoje, somos dois esqueletos vadios... sem Oceano para navegar,

e esperamos,

impacientemente que acorde a madrugada.

 

(e hoje... nada me apetece escrever...)

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quarta-feira, 3 de Dezembro de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:58

07
Jul 11

A podridão da chuva nas tardes de domingo,

Automóveis que circulam na azia do almoço quando do estômago se levanta o cansaço da digestão, o peixe pregado à parede da casa sorri como ventoinhas abraçadas aos círculos das horas, o vinho a granel saltita de mesa em mesa, o taberneiro de cigarro suspenso nos lábios enrolado nos pêlos invisíveis da barba semeada numa tarde de vento, a gordura peganhosa das mãos salientes como pincéis calcinados na tela do relento, cospe para o chão, mergulha os dentes em bolos de bacalhau e sandes de presunto, ovos cozidos que salpicam latas de atum, e no pavimento as beatas de cigarro deixadas pelos marinheiros, o peixe do rio assado uma delícia, recordo-me eu da tarde que sentado à mesa não percebia o boneco de barro sobre o balcão e pintado de palavras,

- Queres fiado toma,

O rádio engasgado no terço da tarde, “Ave-Maria, cheia de graça, o senhor é convosco”, e confirma que foi o senhor que roubou os perus do meu quintal, sim excelência fui eu, respondo-lhe pausadamente, “Pai nosso que estais no céu”, condeno-o a três meses de trabalhos forçados e em seis meses sem contacto com livros ou a possibilidade de escrever, está bem assim?, perguntam-me, e eu respondo que sim, que posso eu responder, o boneco de barro olha-me ,

- Abre o olho pá, sussurra-me o taberneiro enquanto me debato com as espinhas do peixe,

Seis meses sem livros?, Seis meses sem escrever?,

- Que alivio para nós, os leitores do meu blog,

Eu em luta de pinguins com as rodelas de cebola, furo-lhes os olhos com o garfo inclinado, o braço que segura o garfo em rotação, a rodela de cebola em círculos concêntricos, e pimba contra as teias de aranha do soalho do primeiro andar,

- Queres fiado toma,

Desisto,

Não sou capaz, não sou capaz de olhar as rodelas de cebola, o cheiro revolta-se-me no estômago e vomito pedacinhos de letras, a diarreia de vogais e as sílabas em esguicho do nariz embriagado,

Caio para o lado, tombo da cadeira e estatelo-me no soalho nauseabundo de saliva, a podridão da chuva nas tardes de domingo, e quando acordo eu sentado no cimo de uma montanha, e ao fundo, ao fundo bem lá longe, o Douro curvilíneo a contornar os socalcos.

publicado por Francisco Luís Fontinha às 19:39

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