Blog de Luís Fontinha. Nasceu em Luanda a 23/01/1966 e reside em Alijó - Portugal desde Setembro de 1971. Desenhador de construção civil, estudou Eng. Mecânica na ESTiG. Escreve, pinta, apaixonado por livros e cachimbos...

27
Nov 14

Alicerçar-me nos teus braços

como se eu fosse um faminto,

não.

 

Um sorriso de pergaminho

nos lábios de uma caneta de tinta permanente,

uma folha húmida,

como a tua pele...

sobre a secretária desarrumada,

uma pilha de livros à minha espera...

e nada,

nem palavras,

nem leitura,

apenas oiço “Wordsong”...

e... e imagino o “AL Berto” deambulando

pela cidade dos transatlânticos...

 

 

 

Francisco Luís Fontinha – Alijó

Quinta-feira, 27 de Novembro de 2014

publicado por Francisco Luís Fontinha às 23:06

16
Set 13

foto de: A&M ART and Photos

 

Há uma estrela cansada de viver, há uma estrela apaixonada pela tempestade invisível das cidades com edifícios carnívoros, os homens, como eu, são comidos por poderosas guilhotinas de aço inoxidável, o carbono sabe a poeira de marfim, e ela passeia-se pelos jardins com árvores de papel,

Equações com muitas incógnitas dormem docemente na palma da tua mão, tu tocas os mamilos pelo integrais triplas, e diferenciais equações desenhadas no coração da areia, o mar, o mar regressa a ti e leva-as, como levas os ossos nossos que as guilhotina de aço

Comeram? Comem? Adormecem na tua face as abelhas claridade das manhas de Outono, sinto o frio entranhar-se em mim, serás tu, tu

Disfarçada de cetim?

Tecido barato, chita, ou...

O cigano refila com ela, o cigano tenta embrulhar a menina num cubo de vidro, mas a menina, toda sabida, consegue aldrabar o cigano...

Perguntas-me

Quem, quem consegue enganar um cigano?

Fico sem música, Wordsong silencia-se e oiço o AL Berto sobre a minha secretária a discursar, pergunto,

Quem, quem consegue enganar um cigano?

Outro cigano? Outro homem como eu, comido e bebido pela guilhotina de aço? Não, Não poderá ser... assim choviam navalhas sobre o cansaço das tardes de Carvalhais, e sempre tive uma paixão secreta por ela, por S. Pedro do Sul... pelas Termas de S. Pedro do Sul...

O avô Domingos,

“Olha meu menino... a filha do Zé é única como tu e têm muitos bens...”

É maluca como eu..., segredava-me o meu outro eu,

O avô Domingos,

“Muitas terras, casas...”

E eu e o outro eu... Queremos lá saber disso, nós queremos viver livremente, correr, atravessar o mar em direcção a Sul, depois viramos à direita logo à saída de Castro Daire, e é lá, é lá que está ela à espera de um fedelho em círculos, prisioneiro à mão do avô Domingo, nessa altura

Não “Fingertips”,

O avô Domingos,

Finger quê menino?

Nada, nada avô... estava a falar da Teresa, daquela que você diz ter muitas terras, e casas... e parvoíce a mais dentro do pequeno cérebro misturado em areia e teias de aranha,

Sina de dinheiro,

O quê? Finger quê?

Nada avô... nada... é a janela que está empenada, e quando o tio Serafim liga o desgraçado do moinho eléctrico... a luz murcha

Damos-lhe Viagra, meu menino..., não avô, não podemos...

Porquê, meu menino?

Porque ainda não inventaram o Viagra e ainda não existem os Fingertips...

Finger quê, meu menino, Finger quê?

Nada, nada avô, nada, porque o sol vem sempre acompanhado, nada, nada avô, nada, porque a chuva traz sempre outro amigo, e esse amigos traz um pedaço de vento e o vento

Leva-te os papeis onde escreves, não é meu menino?

(nada avô... nada... é a janela que está empenada, e quando o tio Serafim liga o desgraçado do moinho eléctrico... a luz murcha

Damos-lhe Viagra, meu menino..., não avô, não podemos...

Porquê, meu menino?

Porque ainda não inventaram o Viagra e ainda não existem os Fingertips...

Finger quê, meu menino, Finger quê?)

E sentava-me junto às bananeiras, pertinho dos antigos balneários, e havia um banco só meu, tinha sempre na mão um livro, um caderno e uma caneta, e passava tardes inteiras a conversar com o enxofre da fonte incandescente junto a mim...

Nunca mais ouvia as palavras dele. Nunca mais.

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

Segunda-feira, 16 de Setembro de 2013

publicado por Francisco Luís Fontinha às 23:41

23
Dez 12

Nasci numa aldeia cinzenta, e todas as pessoas traziam na cabeça uma flor de lótus, uma pequena ribeira caminhava sem destino entre os canaviais e os choupos velhos e caducos que viviam em comunhão de bens, felizes no casamento, tinham três filhos, duas raparigas, e eu

 

eu continuo sem saber o que sou,

 

as raparigas desde muito cedo começaram a fazer desenhos nas paredes da casa, um rés-do-chão enfaixado nas amoreiras e silvais que depois de cair a noite desapareciam como desaparecia o fumo dos cigarros do meu irmão, sisudo, chato, um travesti de trinta e dois anos, bancário, regressava a casa depois de um longo dia de trabalho, apanhava o eléctrico, contava as pombas até chegar à porta de entrada do prédio, entrava, começava a subir as escadas tranquilamente, no patamar do primeiro andar ainda era o Carlos, subia, subia, e quando chegava ao quinto andar,

 

agora sei o meu nome,

 

Maria Feliz, entrava em casa, descalçava os sapatos altíssimos e colocava as pernas sobre a mesa de mármore que jazia no centro da sala de estar, pegava no comando da aparelhagem sonora, carregava no PLAY e sempre o mesmo CD no seu interior

 

agora sei o meu nome,

 

Wordsong (AL Berto)

 

e ele,

 

ela,

 

tinham saudades dos tempos da infância quando apenas tinham como memória uma aldeia cinzenta, apodrecida, a madeira das traves e dos barrotes, de vez em quando, pingava um líquido sujo e espesso, e quando lhe passava o dedo e levava-o à boca

 

ela percebia que eram lágrimas com mel,

 

chovia dentro de casa, tínhamos um cão a que dávamos o nome de REX, e quase sempre o gajo desobedecia-nos, traquina, as raparigas desde muito cedo começaram a fazer desenhos nas paredes da casa, um rés-do-chão enfaixado nas amoreiras e silvais que depois de cair a noite desapareciam como desaparecia o fumo dos cigarros do meu irmão, e nós deliciávamos-nos com os poemas

 

eu continuo sem saber o que sou,

 

ele

 

sisudo,

 

ela

 

levantava-se do sofá, acabava de despir-se, e quando se olhava no espelho e percebia que não tinha sobre si outra qualquer roupa, nem vestígios dele, corria até à casa de banho, abria a torneira da água quente, deixava-a borbulhar como uma panela ao lume com estrelas e pedaços de néon, e aos poucos e silenciosos sonhos do mar, começava numa carícia intensiva, até se cansar, até perceber que ela era ela, até

 

ele

 

sisudo,

 

ela

 

ela percebia que eram lágrimas com mel que o seu corpo derramava como se fossem a seiva envenenada das árvores de papel, sisudo, e pendurava no armário o Carlos, e a lua apoderava-se dela, e a lua escrevia no corpo dela,

 

viste o Carlos?

 

ele

 

sisudo,

 

ele

 

chato,

 

ele, que todos os dias se levantava de madrugada, Maria Feliz ia ao guarda-fato, tirava o Carlos, vestia-se, raramente tomava o pequeno-almoço, deixa-a sobre a cama até que o cair da noite se agarrava às janelas do quinto andar,

 

sisudo,

 

agora sei o meu nome, agora percebo a cor da aldeia onde nasci, vivi, cresci..., e quase

 

morri,

 

ela

 

viste o Carlos?

 

chato, sisudo, as árvores que nem os malditos pássaros encarnados queriam sentar-se sobre elas, é triste, era triste a solidão dos dias, e percebia que as minhas irmãs

 

não gostam de mim, sempre me odiaram, viste o Carlos? Apenas palavras para os poucos transeuntes ouvirem, porque nas minhas costas

 

o Carlos é um chato, e sisudo, e

 

as ruas deixavam de pertencerem-me, e

 

ela

 

viste o Carlos?

 

e elas sempre souberam que nunca existiu nenhum Carlos, e elas

 

as raparigas desde muito cedo começaram a fazer desenhos nas paredes da casa, um rés-do-chão enfaixado

 

numa rua de Cais do Sodré, e quase

 

morri.

 

(não revisto)

@Francisco Luís Fontinha

Alijó

publicado por Francisco Luís Fontinha às 19:54

10
Abr 12

 

“Com Worsong, a 101 Noites aventura-se numa nova coleção que pretende criar um diálogo entre a música e a poesia contemporânea.

AL Berto (1948-1997), uma das vozes mais singulares da poesia portuguesa do século XX, foi o poeta homenageado neste primeiro trabalho. Wordsong é um projeto da autoria de três músicos, Pedro d’Orey, Alexandre Cortez e Nuno Grácio, que procuraram criar um invólucro sonoro para os poemas de AL Berto. O resultado é uma série de canções em formato pop rock, onde a música se apropria da palavra escrita, dando-lhe uma outra liberdade cheia de novos sentidos e novas sensações. Wordsong é constituído por dois objetos que se complementam e interligam. Um livro de poemas com fotografias e ilustrações e um CD com quinze canções inéditas” 101 Noites

 

Excelente trabalho. Na segunda edição que possuo inclui participações de: João Peste, J.P. Simões e Sérgio Costa.

Mais informações em:

(http://www.101noites.com/)

publicado por Francisco Luís Fontinha às 22:33

25
Mar 12
publicado por Francisco Luís Fontinha às 01:06

10
Fev 12
publicado por Francisco Luís Fontinha às 20:30

14
Jan 12
 

Desenho de Francisco Luís Fontinha e música de Wordsong (AL Berto).
Wordsong é um projeto multimédia de Pedro d´Orey (Mler If Dada), Alexandre Cortez (Rádio Macau), Nuno Grácio e Filipe Valentim (Rádio Macau).

 

publicado por Francisco Luís Fontinha às 12:43

12
Dez 11
publicado por Francisco Luís Fontinha às 16:13

07
Dez 11
 
Wordsong (AL Berto).
Wordsong é um projeto multimédia de Pedro d´Orey (Mler If Dada), Alexandre Cortez (Rádio Macau), Nuno Grácio e Filipe Valentim (Rádio Macau).

 

publicado por Francisco Luís Fontinha às 12:54

05
Dez 11
 

Desenho de Luís Fontinha e música de Wordsong (AL Berto).
Wordsong é um projeto multimédia de Pedro d´Orey (Mler If Dada), Alexandre Cortez (Rádio Macau), Nuno Grácio e Filipe Valentim (Rádio Macau).
http://cachimbodeagua.blogs.sapo.ao/
http://francisco-orgasmosliterarios.blogspot.com/

 

publicado por Francisco Luís Fontinha às 23:51

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